terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Detento passa em concurso público para gari


Apenas um exame psicológico separa o ex-detento Ari Souza dos Santos, 30 anos, de um emprego concursado como gari em Goiânia. Na próxima quarta, Souza vai acertar os últimos detalhes para fazer parte do quadro de funcionários da Companhia Municipal de Urbanização de Goiânia (Comurg). Ele passou em 430º lugar no concurso promovido pelo órgão no final do ano passado para gari, com a nota 93,75 (de 100 pontos possíveis).

Santos foi preso por ter matado um homem em Alto Paraíso, interior de Goiás, em 2002. Cumpriu pena e resolveu estudar para passar num concurso público.

"Meu sonho é ser auditor da Receita, que nem minha prima em Brasília. Eu estou só começando o caminho para conquistar esse sonho. Não vou ficar parado como gari. Quero estudar, terminar o segundo grau, faltam dois anos e meio, depois fazer uma faculdade e continuar prestando concurso e melhorando lá dentro da prefeitura. Disseram que se eu terminar o segundo grau, posso ser promovido, então agora sei que estou no caminho certo", disse.

Santos foi preso pela primeira vez em janeiro de 2004, pelo homicídio. Cumpriu oito meses da pena e conseguiu a liberdade por bom comportamento. Voltou a ser preso por tráfico de drogas e ficou mais dois anos e meio detido. Fugiu para Goiânia após permanecer três meses no regime semiaberto, onde ficou um ano. Em janeiro de 2008 foi detido mais uma vez, durante uma abordagem de rotina da Polícia Militar.

A oportunidade de emprego veio quando um dos irmãos de Santos, que já trabalhava na Comurg, falou sobre o concurso. "Ele estava com meus documentos, então fez a inscrição para mim. Concurso é bom para quem passou pela cadeia porque não tem esse negócio de preconceito, de dizer que não vai trabalhar porque é preso. Passou e pronto, ninguém tem nada com isso."

Santos fez a prova prática em dezembro do ano passado e no mesmo dia ficou sabendo que estava entre os aprovados. No dia 16 de dezembro saiu o edital com seu nome entre os selecionados. Ele guarda uma cópia do documento com orgulho. "Foi aqui que eu vi que minha vida estava mesmo mudando."

O agora gari diz que não foi fácil deixar a criminalidade e contou com a ajuda, principalmente do tenente Sandro Mendonça, gerente de produção agroindustrial da Superintendência do Sistema Prisional do Estado (Susepe). Mendonça conheceu Santos quando o detento passou pelo regime semiaberto e viu nele força de vontade para mudar. "Ele tinha um bom comportamento e tinha muita disposição, muita vontade", afirmou Mendonça.

O gerente contatou uma Organização Não Governamental que ajuda ex-detentos para financiar as viagens de Santos para Goiânia. "Se não fosse pela ajuda deles, e do diretor do presídio de Alto Paraíso, eu não estaria aqui hoje", disse o gari, na porta de sua casa de um único cômodo em Goiânia.

Na tarde desta segunda-feira, em audiência com o juiz Decildo Ferreira Lopes, Santos assumiu diversos compromissos para conseguir a liberdade condicional. Não precisa mais passar as noites na cadeia. E uma vez por mês deve comparecer no Fórum de Goiânia. Ele diz que agora, tudo o que quer é começar logo a trabalhar e ganhar seu salário de aproximadamente R$ 800.

"No tráfico, se ganha muito mais, mas pelo menos lá na prefeitura, concursado, eu vou ganhar meu dinheiro e poder olhar para as pessoas sem ser julgado, ter uma vida direita, realizar meu sonho e parar de dar tristeza pra minha mãe."

Créditos: Márcio Leijoto - Especial para o Terra

Resumo da Ópera: Taí um grande exemplo para a sociedade e uma boa lição para o Governo. Enquanto rios de dinheiro são roubados dos cofres públicos e colocados em meias, cuecas, malas, "bolsa grande" e onde mais o corrupto conseguir escondê-los, o ex-detento Ari Souza dos Santos, cheio de orgulho, dá a volta por cima e mostra a essa corja o caminho da honestidade e da cidadania.

Faltam incentivos e investimentos do governo para essa população voltar à sociedade. Esse cidadão contou com a colaboração de uma ONG e do diretor prisional e alcançou seu objetivo. Que tal se o Estado tomasse-o como exemplo e incentivasse muitos deles no País afora? Fica a sugestão.

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